Thursday 4 December 2008

Free Surf Nº 6 - Editorial



Parece mal dizer coisas menos boas dos surfistas portugueses, mas é exactamente isso que vou fazer. Mas não de todos.
Fiquei surpreendido com o facto de, com tantos surfistas patrocinados, que temos em Portugal, só catorze portugueses se inscreveram no WQS seis estrelas do Estoril. Surpreende porque havia vagas, porque os surfistas portugueses têm dinheiro, quando comparados com outros, por exemplo os brasileiros, que se inscreveram massivamente no seis estrelas de Ubatuba (mais ou menos 100 em 144), surpreende porque parece que temos medo de competir com os melhores, surpreende porque entre a Costa da Caparica, o Estoril, a Ericeira e Peniche existem, pelo menos que me lembre, mais de cinquenta surfistas “patrocinados” que poderiam evoluir só por entrar num campeonato com o leque de competidores que o seis estrelas do Estoril teve. Sinceramente é desolador. Num país com uma costa excelente como é Portugal, com boas ondas e consistência, seguramente temos mais de 300 dias de surf por ano, apenas 14 surfistas tiveram a coragem e a ousadia de se inscreverem num seis estrelas. Destes 14 temos vários que não são patrocinados e outros que não se comportam nem dentro, nem fora de água como alguns “campeões” que não tiveram a coragem nem a humildade de se inscreverem.

Penso que o problema destes surfistas é o excesso de tudo, excesso de pranchas, excesso de patrocínios, excesso de apoios, o facto de nada lhes fazer falta e de terem tudo o que precisam, às vezes bem mais do que precisam faz com que não tenham vontade, nem garra para lutar por nada. De outro modo faz também com que não tenham capacidade de se confrontar com aqueles que potencialmente são melhores do que eles, muito melhores do que eles. O ano passado disse numa conversa a propósito dos surfistas portugueses que eles não sabiam muito bem para onde queriam ir, não tinham uma estratégia e por isso andavam sem rumo. Penso hoje que é mais grave. Estes surfistas têm medo de se testarem verdadeiramente, com quem pode ser melhor do que eles. Se lermos nas suas entrevistas, todos vão ser campeões do mundo, mas nenhum está disposto a trilhar o caminho para lá chegar. De repente estão à espera que como as pranchas e os fatos e a roupa, os carros e os ipods tudo chegue a casa sem se esforçarem. Erro. Provavelmente não teremos nenhum Tiago Pires, durante mais uma geração. Provavelmente temos o que merecemos.

Podemos também dizer que os culpados não são os surfistas mas os treinadores que não querem ver o seu ganha pão sujeito ao escrutínio da competição de alto nível, ou mesmo dos patrocinadores que não têm mão firme para impor aos seus patrocinados determinados objectivos anuais, semestrais, trimestrais, mensais ou mesmo semanais. Ou talvez os patrocinadores não tenham “peso” para impor coisa nenhuma porque só dão roupa e pouco mais.

Claro que haverá sempre aqueles que dirão que não faz parte dos objectivos de surfista A ou B competirem num seis estrelas, pois não têm pretensões internacionais, blá, blá, blá…é como dizer que: “não Jogos Olímpicos não me interessa, quero mesmo é ser o “campeão do bairro”. Será concerteza por essa razão que em vez do seis estrelas que alguns dos atletas sub20 decidiram apostar no Pro Junior Nacional, que convenientemente decorreu ao mesmo tempo.

Deixem-se disso, aspirar a ser melhor é o que nos move, se não conseguem fazê-lo devem estar preocupados.

Fui um jogador de ténis medíocre, número 500 num ranking de 1500. Competi sempre para ganhar, mas a maior parte das vezes, perdi dois sets de seguida em menos de 30 minutos. Também ganhei algumas vezes. No entanto a única coisa que perdi foi mesmo os sets, porque de resto melhorei o meu jogo e a minha capacidade de me confrontar com os outros.

Penso que os surfistas da nossa praça devem sinceramente perder o medo de perder.

Esta é a última edição de 2008 e por isso cumpre agradecer aos nossos colaboradores, sem os quais não tínhamos interesse nenhum, mas também aos nossos anunciantes que acreditaram num projecto inovador na área do surf onde ousamos ir para além do brilho do papel e chegar de uma forma simples e gratuita a todos os surfistas e a todos que não o sendo desejavam sê-lo.

Muito Obrigado a todos!!!


Boas Ondas


in Free Surf Mag - nº6

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